quinta-feira, 7 de setembro de 2017

O PENSAMENTO CRIATIVO

O PENSAMENTO CRIATIVO

Se a filosofia mantém com a mitologia, a religião e o senso comum relações muitas vezes conflituosas, de negação, em razão do panorama fechado que cada uma delas apresenta, com a arte e a ciência, dadas suas perspectivas sempre abertas e criativas, a filosofia conserva relações positivas, muitas vezes de interdependência.
Fazer arte não é fazer filosofia nem ciência; do mesmo modo, pensar filosoficamente não se confunde nem com o fazer artístico nem com o teorizar científico. Mas, como veremos no próximo capítulo, em suas atividades criativas, constantemente a filosofia precisa dialogar com a arte e com a ciência para produzir seus conceitos. Da mesma forma, a ciência tem necessidade de diálogo com a arte e a filosofia para produzir suas teorias. E a arte também necessita de componentes da filosofia e da ciência na criação de suas obras.

TEXTO PARA LEITURA: 

Será que um produto também pode se tornar um mito? É o que o estudioso francês Roland Barthes discute no texto a seguir, escrito na década 1950. Para Barthes, o plástico mudou o mundo contemporâneo e gerou toda uma mística a seu redor.

O PLÁSTICO

Apesar dos seus nomes de pastores gregos (Polistirene, Fenoplaste, Polivinile e Polietilene), o plástico, cujos produtos foram recentemente concentrados numa exposição, é essencialmente uma substância alquímica. À entrada do stand, o público espera demoradamente, em fila, a fim de ver realizar-se a operação mágica por excelência: a conversão da matéria; uma máquina ideal, tubulada e oblonga (forma apropriada para manifestar o segredo de um itinerário) transforma sem esforço um monte de cristais esverdeados em potes brilhantes e canelados. De um lado, a matéria bruta, telúrica, e, do outro, o objeto perfeito, humano; e, entre esses dois extremos, nada; apenas um trajeto, vagamente vigiado por um empregado de boné, meio deus, meio autômato.
Assim, mais do que uma substância, o plástico é a própria ideia da sua transformação infinita, é a ubiquidade tornada visível, como o seu nome vulgar o indica; e, por isso mesmo, é considerado uma matéria milagrosa: o milagre é sempre uma conversão brusca da natureza. O plástico fica inteiramente impregnado desse espanto: é menos um objeto do que o vestígio de um movimento. E como esse movimento é, nesse caso, quase infinito, transformando os cristais originais numa variedade de objetos cada vez mais surpreendentes, o plástico é, em suma, um espetáculo a se decifrar: o próprio espetáculo dos seus resultados. 
Perante cada forma terminal (mala, escova, carroceria de automóvel, brinquedo, tecido, cano, bacia ou papel), o espírito considera sistematicamente a matéria-prima como enigma. Este “proteísmo” do plástico é total: pode formar tão facilmente um balde como uma joia. Daí o espanto perpétuo, o sonho do homem perante as proliferações da matéria, perante as ligações que surpreende entre o singular da origem e o plural dos efeitos. Trata-se, aliás, de um espanto feliz, visto que o homem mede o seu poder pela amplitude das transformações
e que o próprio itinerário do plástico lhe dá a euforia de um prestigioso movimento ao longo da Natureza. Mas o preço desse êxito está no fato de que o plástico, sublimado como movimento, quase não existe como substância.
A sua constituição é negativa: não sendo duro nem profundo, tem de se contentar com uma qualidade substancial neutra, apesar das suas vantagens utilitárias: a “resistência”, estado que supõe o simples suspender de um abandono.
Na ordem poética das grandes substâncias, é um material desfavorecido, perdido entre a efusão das borrachas e a dureza plana do metal: não realiza nenhum dos verdadeiros produtos da ordem mineral, espumas, fibras, estratos. É uma substância alterada: seja qual for o estado em que se transforme, o plástico conserva uma aparência flocosa, algo turvo, cremoso e entorpecido, uma impotência em atingir alguma vez o liso triunfante da Natureza. Mas aquilo que mais o trai é o som que produz, simultaneamente oco e plano. O ruído que produz derrota-o, assim como as suas cores, pois parece fixar apenas as mais químicas: do amarelo, do vermelho e do verde só conserva o estado agressivo, utilizando-as somente como um nome, capaz de ostentar apenas conceitos de cores. A moda do plástico acusa uma evolução no mito do símili sendo um costume historicamente burguês (as primeiras imitações, no vestuário, datam do início do capitalismo); mas até hoje o símili sempre denotou a pretensão, fazia parte de um mundo da aparência, não da utilização prática, pretendia reproduzir pelo menor preço as substâncias mais raras, o diamante, a seda, as plumas, as peles, a prata, tudo o que de brilhante houvesse no mundo. O plástico a preço reduzido é uma substância doméstica. É a primeira matéria mágica a adquirir o prosaísmo; mais precisamente, porque esse prosaísmo é para ele uma razão triunfante de existência: pela primeira vez o artifício visa o comum, e não o raro. E, paralelamente, modifica-se a função ancestral da natureza: ela deixou de ser a Ideia, a pura Substância a recuperar ou a imitar; uma matéria artificial, mais fecunda do que todas as jazidas do mundo, vai substituí-la e comandar a própria invenção das formas. Um objeto luxuoso está sempre ligado a terra, recorda sempre de uma maneira preciosa a sua origem mineral ou animal, o tema natural de que é apenas uma atualidade. O plástico é totalmente absorvido pela sua utilização: em última instância, inventar-se-ão objetos pelo simples prazer de os utilizar. Aboliu-se a hierarquia das substâncias, uma só substituiu todas as outras: o mundo inteiro pode ser plastificado, e até mesmo a própria vida, visto que, ao que parece, já se começaram a fabricar aortas de plástico.

BARTHES, Roland. Mitologias. 11. ed.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p. 111-113.

Questões sobre o texto:

1 Roland Barthes analisa o plástico como um mito, carregado de significados sagrados. Quais passagens do texto podem justificar essa afirmação?

2 Que outros produtos atuais também poderiam ser analisados como mitos? Explique sua resposta.

3 A qual tipo de mito Roland Barthes se refere: ao mito antigo ou o mito contemporâneo?





terça-feira, 16 de maio de 2017

ASSIM POIS A QUESTÃO...

Uma vez formulada a pequena e complexa questão “O que é a filosofia?”, para chegar à resposta é preciso percorrer caminhos, buscando pistas por meio de outras indagações:
“O que é o filósofo?”, “O que é o conceito?”, “Como é filosofar?”. Assim fizeram Gilles Deleuze e o psicanalista e filósofo Félix Guattari quando escreveram o livro O que é a filosofia?. O texto abaixo é um trecho da introdução desta obra. Observe como questionar é um ato importante para a filosofia, que serve de instrumento ao filósofo durante sua investigação.

ASSIM POIS A QUESTÃO...

O filósofo é o amigo do conceito, ele é conceito em potência. Quer dizer que a filosofia não é uma simples arte de formar, de inventar ou de fabricar conceitos, pois os conceitos não são necessariamente formas, achados ou produtos.
A filosofia, mais rigorosamente, é a disciplina que consiste em criar conceitos. [...] Criar conceitos sempre novos é o objeto da filosofia. É porque o conceito deve ser criado que ele remete ao filósofo como àquele que o tem em potência, ou que tem sua potência e sua competência. [...] Os conceitos não nos esperam inteiramente feitos, como corpos celestes.
Não há céu para os conceitos. Eles devem ser inventados, fabricados ou antes criados, e não seriam nada sem a assinatura daqueles que os criam. Nietzsche determinou a tarefa da filosofia quando escreveu: “os filósofos não devem mais contentar-se em aceitar os conceitos que lhes são dados, para somente limpá-los e fazê-los reluzir, mas é necessário que eles comecem por fabricá-los, criá-los, afirmá-los, persuadindo os homens a utilizá-los. Até o presente momento, tudo somado, cada um tinha confiança em seus conceitos, como num dote miraculoso vindo de algum mundo igualmente miraculoso”, mas é necessário substituir a confiança pela desconfiança, e é dos conceitos que o filósofo deve desconfiar mais, desde que ele mesmo não os criou
[...]. Platão dizia que é necessário contemplar as Ideias, mas tinha sido necessário, antes, que ele criasse o conceito de Ideia. Que valeria um filósofo do qual se pudesse dizer: ele não criou um conceito, ele não criou seus conceitos? [...]

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia?.
São Paulo: Ed. 34, 1992.


Livro didático: Filosofia experiência do pensamento, Silvio Gallo. 2015/2017

quinta-feira, 11 de maio de 2017

FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS

FILÓSOFOS
 PRÉ-SOCRÁTICOS
Os filósofos pré-socráticos fazem parte do primeiro período da filosofia grega. Eles desenvolveram suas teorias do século VII ao V a.C. Recebem esse nome, posto que são os filósosfos que antecederam Sócrates. Os filósofos pré-socráticos buscavam nos elementos natureza as respostas sobre a origem do ser e do mundo. Focando principalmente nos aspectos da natureza, eram chamados de “filósofos da physis”.

SÓCRATES
Sócrates (470 a.C-399 a.C.) foi um importante filósofo grego do segundo período da filosofia. Nasceu em Atenas sendo considerado um dos fundadores da filosofia ocidental. A filosofia de Sócrates, baseada no diálogo, era chamada de filosofia socrática. Era marcada pela expressão “conhece-te a ti mesmo”, em virtude da busca da verdade através do autoconhecimento. Ademais, da filosofia do “diálogo” de Sócrates, destaca-se a “maiêutica”, que significa literalmente “trazer a luz”. Esta faz relação com a iluminação da verdade que, para ele, está contida no próprio ser.
FILOSOFIA GREGA
Para melhor entender a filosofia grega, vale lembrar como ela está dividida:
Período Pré-Socrático: fase naturalista
Período Socrático: fase antropológica-metafísica
Período Helenístico: fase ética e cética
CORRENTES OU ESCOLAS
PRÉ-SOCRÁTICAS
Segundo o foco e o local de desenvolvimento da filosofia, o período pré-socrático está dividido em Escolas ou Correntes de pensamento, a saber:
Escola Jônica: desenvolvida na colônia grega Jônia, na Ásia Menor (atual Turquia), seus principais representantes são: Tales de Mileto, Anaxímenes de Mileto, Anaximandro de Mileto e Heráclito de Éfeso.
Escola Pitagórica: também chamada de "Escola Itálica", foi desenvolvida no sul da Itália, e recebe esse nome posto que seu principal representante foi Pitágoras de Samos.
Escola Eleática: desenvolvida no sul da Itália, sendo seus principais representantes: Xenófanes de Colofão, Parmênides de Eléia e Zenão de Eléia.
Escola Atomista: também chamada de “Atomismo”, foi desenvolvida na região da Trácia, sendo seus principais representantes: Demócrito de Abdera e Leucipo de Abdera.
PRINCIPAIS FILÓSOFOS
PRÉ-SOCRÁTICOS
Segue abaixo os principais filósofos do período pré-socrático:
Tales de Mileto (624 a.C.-548 a.C.): nascido na cidade de Mileto, região da Jônia, Tales acreditava que a água era o principal elemento, ou seja, era a essência de todas as coisas.
Anaximandro de Mileto (610 a.C.-547 a.C.): discípulo de Tales nascido em Mileto, para Anaximandro o princípio de tudo estava no elemento denominado “ápeiron”, uma espécie de matéria infinita.
Anaxímenes de Mileto (588 a.C.-524 a.C.): discípulo de Anaximandro nascido em Mileto, para Anaxímenes o princípio de todas as coisas estava no elemento ar.
Heráclito de Éfeso (540 a.C.-476 a.C.): considerado o “Pai da Dialética”, Heráclito nasceu em Éfeso e explorou a ideia do devir (fluidez das coisas). Para ele, o princípio de todas as coisas estava contido no elemento fogo.
Pitágoras de Samos (570 a.C.-497 a.C.): filósofo e matemático nascido na cidade de Samos, para ele os números foram seus principais elementos de estudo e reflexão, do qual se destaca o “Teorema de Pitágoras”.
Xenófanes de Cólofon: (570 a.C.-475 a.C.): nascido em Cólofon, Xenófanes foi um dos fundadores da Escola Eleática, se opondo contra o misticismo na filosofia e o antropomorfismo.
Parmênides de Eléia (530 a.C.-460 a.C.): discípulo de Xenófanes, Parmênides nasceu em Eléia. Focou nos conceitos de “aletheia” e “doxa”, donde o primeiro significa a luz da verdade e o segundo, é relativo à opinião.
Zenão de Eléia (490 a.C.-430 a.C.): discípulo de Parmênides, Zenão nasceu em Eléia. Foi grande defensor das ideias de seu mestre filosofando, sobretudo, acerca dos conceitos de “Dialética” e “Paradoxo”.
Demócrito de Abdera (460 a.C.- 370 a.C.): nascido na cidade de Abdera, Demócrito foi discípulo de Leucipo. Para ele, o átomo era o princípio de todas as coisas, desenvolvendo assim, a “Teoria Atômica”.


PRÉ-SOCRÁTICOS

Pré-Socráticos
No estudo da história da filosofia, os primeiros filósofos são chamados de pré-socráticos. Apesar de passar a ideia de que existiram antes de Sócrates, o termo pré-socrático indica uma tendência de pensamento, estando relacionado também com filósofos que viveram na mesma época de Sócrates e até mesmo depois dele.
Aquilo que une os filósofos pré-socráticos é a preocupação em perguntar e compreender a natureza do mundo (a physis). Queriam entender a origem, aquilo que originou todas as coisas, o princípio delas. Os filósofos pré-socráticos são divididos em escolas do pensamento: Escola Jônica, Escola Itálica, Escola Eleática, Escola Atomística; de acordo com o local e problemas discutidos por seus pensadores.
A Escola Jônica recebe este nome por se desenvolver na colônia grega Jônia, na Ásia Menor, local onde hoje é a Turquia. Seus principais filósofos foram: Tales de Mileto, Anaxímenes de Mileto, Anaximandro de Mileto e Heráclito de Éfeso. Pensavam sobre o elemento primeiro, chegando a conclusões diferentes. Para Tales, o elemento que forma todas as coisas é a Água. Para Anaximandro, o elemento é o Ápeiron, aquilo que é ilimitado e que possibilita a união e separação dos diferentes corpos. Para Anaxímenes, o elemento é o Ar. De acordo com Heráclito, o elemento que representa a natureza das coisas é o fogo. Apesar das diferenças sobre qual seria o elemento primeiro, os filósofos da Escola Jônica pensavam o mundo como algo em movimento, a água que congela e evapora, o ápeiron que não pode ser determinado e não é estático, o ar nada palpável e o fogo que está sempre em movimento e transformando o que queima.
A Escola Itálica se desenvolveu no sul da Itália. O filósofo principal desta escola foi Pitágoras de Samos. Nascido na ilha de Samos, foi na península itálica, na cidade de Crotona, onde ele desenvolveu suas ideias. Pensou serem os números as essências das coisas. Suas investigações da física e matemática eram misturadas com misticismo. São atribuídos aos discípulos de Pitágoras, os pitagóricos, diversas descobertas matemáticas. Foi Pitágoras o responsável pela criação da palavra filosofia (amizade pela sabedoria) ao chamar a si mesmo de filósofo (amigo da sabedoria).
A Escola Eleática se desenvolveu na cidade de Eleia, ao sul da Itália. Seus principais filósofos foram Xenófanes de Cólofon, Parmênides de Eleia e Zenão de Eleia. Apesar de não ter nascido em Eleia, Xenófanes se estabeleceu na cidade após levar uma vida andando de povoado em povoado. A ideia principal ensinada por Xenófanes e posteriormente trabalhada por Parmênides é a ideia de Um. Xenófanes pensava no Um a partir de um pensamento mais voltado à religião, dizendo que Deus é Um, não foi feito, é eterno, perfeito e não se modifica. Em oposição à Escola Jônica, Parmênides pensa que o mundo é formado por um Ser-Absoluto, que não foi feito, é eterno, perfeito e não se modifica. Contra a ideia de movimento, Zenão desenvolveu argumentações que foram e são muito discutidas. Entre elas está a ideia de que uma flecha em voo sempre ocupa o seu espaço de flecha, logo a flecha está em repouso e todo movimento é uma ilusão.
A Escola Atomística, ou atomismo, desenvolveu-se a partir da ideia de que são vários os elementos que formam as coisas. A ideia de átomo (a = negação e tomos = divisão, ou seja, aquilo que não pode ser dividido) foi desenvolvida por Leucipo de Mileto e depois trabalhada por Demócrito de Abdera e Epicuro de Samos. Para Leucipo, o mundo é formado a partir do choque aleatório e imprevisível de infinitos átomos.
Embora diversos destes filósofos tenham escrito mais sobre outros assuntos do que sobre a natureza das coisas, como é o caso de Demócrito, que escreveu sobre ética, é o questionar-se sobre a natureza das coisas que os une neste período.
Filipe Rangel Celeti
Colaborador Mundo Educação
Bacharel em Filosofia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie - SP
Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie - SP


terça-feira, 2 de maio de 2017

ESCOLÁSTICA

Escolástica

Seguindo-se ao período da escola patrística, a filosofia praticada no seio do cristianismo passou a ser ensinada em escolas, a partir do século IX. O período conhecido como escolástica perdurou até o fim da idade média e tem seu nome derivado da palavra latina "scholasticus", que significa "aquele que pertence a uma escola". Utilizou-se da base proposta pela patrística, mas com maior dedicação a atividade especulativa, deixando de lado, em parte, a teologia e dedicando-se a formulação da filosofia cristã. O filósofo de maior destaque deste período, que promoveu a transição real do platonismo para uma forma mais sofisticada de filosofia, é Tomás de Aquino. Destacam-se ainda, neste período, Occam, Scoto e Erígena.
O método escolástico consistia em leitura critica de obras selecionadas, aprendendo a apreciar as teorias do autor, por meio do estudo minucioso de seu pensamento e das consequências deste. Neste processo, como complemento, eram explorados outros documentos ou obras relacionadas com a obra em questão. A partir da comparação entre o texto da obra e os documentos a ela relacionados, especialmente documentos da igreja e análises de estudiosos anteriores, se produzia as sententiae, curtas sentenças nas quais eram listadas as discordâncias entre fontes diversas, acerca dos temas tratados na obra em estudo. As setentiae podiam incluir também recortes dos textos originais, para comparação e comentário.
As setentiae serviriam para formular os dois lados da argumentação, buscando um acordo, livre de contradições, acerca do pensamento do autor ou do tema por ele discutido. Para tanto valiam-se da análise filológica e da lógica formal. Na análise filológica procurava-se por palavras que pudessem ter múltiplos significados, ou que o autor pudesse ter utilizado com um significado diferente do usual, o que poderiam resolver questões de discordância imediatamente. Uma vez compreendido, o melhor possível, o que o autor disse e aquilo que ele significou, procedia-se a análise pela lógica formal, explorando a argumentação em busca das conexões e conclusões, verificando a consistência dos argumentos. Neste processo, contradições poderiam ser entendidas como subjetivas do indivíduo que lê o texto, mas não presentes no texto em si. Por outro lado, se reconhecida a contradição de fato, a posição seria rejeitada.
O primeiro período, permanece ligado à filosofia de Agostinho e ao platonismo, neste período destaca-se a ausência de distinção entre natural e sobrenatural, a forte prevalência da fé sobre a razão, bem como uma separação ainda não muito clara entre filosofia e teologia, embora esta ultima já comece a se distinguir como disciplina independente no período patrístico.
Com o advento de Tomás de Aquino, Albertus Magnus e outros pensadores mais ligados a filosofia de Aristóteles, a escolástica entra em uma nova fase. Nesta fase, por volta do século XIII, o uso da razão é enfatizado e amplia-se o uso das novas fontes aristotélicas, uma recuperação das transcrições e traduções dos trabalhos de Aristóteles. Uma síntese da doutrina cristã e da teoria aristotélica é proposta, vindo a definir o que seria a filosofia da Igreja Católica nos séculos seguintes. Para Aquino, razão e argumentação eram a base da filosofia, afastando-se do platonismo e agostinianismo que dominavam os primeiros anos da escolástica, na mesma medida em que se aproximava das posições aristotélicas, especialmente sua metafísica e epistemologia. Dedicou-se particularmente a apontar o que considerou erros de interpretação do comentador Averróis, importante pensador islâmico, permitindo a incorporação da filosofia de Aristóteles.
Após o período dominado pela filosofia de Tomás de Aquino, a escolástica entra em declínio como instituição, mas permanece como campo de estudo, sendo explorada por pensadores contemporâneos como David Oderberg, Giovanni Ventimiglia e Peter King.

Referências bibliográficas:

Hyman, J.; and Walsh, J. J., eds. (1973). Philosophy in the Middle Ages. Indianapolis: Hackett Publishing.
SPINELLI, Miguel. Herança Grega dos Filósofos Medievais. São Paulo: Hucitec, 2013.
Steven P. Marone, "Medieval philosophy in context" in A. S. McGrade, ed., The Cambridge Companion to Medieval Philosophy (Cambridge: Cambridge University Press, 2003); Jean Leclerq, The Love of Learning and the Desire for God. New York: Fordham University Press, 1970.
HIRSCHBERGER, Johannes. História da Filosofia na Idade Média. Trad. Alexandre Correia. São Paulo: Herder, 1966.
McGrath, Alister. 1998. Historical Theology: An Introduction to the History of Christian Thought. Oxford: Blackwell Publishers. Chapter 1 'The Patristic Period, c. 100-451.

Mestre em Filosofia (UFPR, 2013)
Bacharel em Filosofia (UFPR, 2010)
FONTE: http://www.infoescola.com/filosofia/escolastica/

PATRISTICA

Patrística


A escola patrística, ou simplesmente Patrística, foi uma corrente filosófica e período da filosofia, coincidindo com os primeiros séculos da era cristã, em que o desenvolvimento filosófico foi realizado por filósofos padres da Igreja Católica, designando um grupo de padres ou um trabalho por eles desenvolvido. Tendo em Agostinho de Hipona seu principal filósofo, tinha como um de seus principais objetivos a racionalização da fé cristã.
A patrística foi também uma reação ao desenvolvimento filosófico e teológico dos árabes, que já desenvolviam a muito uma relação próxima com a filosofia de Aristóteles. Destacam-se trabalhos no sentido de oferecer argumentação ontológica e lógica para a defesa da existência de um Deus uno e onipotente, de acordo com a teologia cristã, mas também de buscar compreender o formato e justificação da fé cristã, o que auxiliou no desenvolvimento da teologia como disciplina independente.
Iniciando como discussões mais focadas na relação entre cristianismo e judaísmo e estabelecimento canônico do velho testamento, rapidamente evoluiu para avaliar a consistência da fé em termos doutrinários, procurando fortalecer seu estabelecimento no Império Romano cristianizado.
O período da escola patrística é normalmente dividido entre antes e depois do primeiro conselho de Niceia. O objetivo deste conselho foi o de obter um consenso entre as diversas vertentes do cristianismo e seu estudo, estabeleceu-se a questão da natureza do messias cristão e sua relação com Deus, levando assim a uma padronização do ponto de partida dos trabalhos filosóficos da época.
Em alguns casos, o período é dividido de acordo com a vida e obra de seu mais importante pensador, Agostinho. O platonismo, doutrina derivada da filosofia idealista do filósofo grego Platão, foi o mais popular método de proceder no período anterior a Agostinho. Platonistas cristãos, como ficaram conhecidos, defendiam que a essência e fundamento da vida deveria ser a fé. A partir da fé, e não da razão, os homens tomariam decisões em suas vidas e realizariam julgamentos morais. Nesta vertente, destacam-se Clemente de Alexandria e Orígenes.
Agostinho surge como um reformulador da filosofia patrística, explorando temas que estavam além das questões do platonismo cristão e buscando na razão a justificativa para a fé. Explorou a questão do livre arbítrio, defendendo que a Graça Divina seria o elemento garantidor da liberdade humana. Formulou ainda a doutrina do pecado original e a teoria da guerra justa. Agostinho também utilizou-se de argumentos céticos, especialmente em sua refutação à corrente filosófica conhecida como acadêmicos.
No que concerne a sua teoria do conhecimento, contrariando Platão, Agostinho defendeu que o testemunho de outras pessoas, mesmo quando não nos traz uma informação verdadeira ou passível de verificação, podem nos trazer novos conhecimentos. Desenvolveu ainda o "argumento a partir da analogia a outras mentes" como solução padrão para o problema das outras mentes, antecipando um debate que seria levado a cabo, com mais enfase, por Descartes, séculos depois.
Após Agostinho os filósofos patrísticos já contavam com um histórico de grandes discussões e uma estrutura mais robusta como base de seu pensamento. Neste período destaca-se Anselmo de Aosta que, entre outros trabalhos, formulou um argumento ontológico para a existência de Deus que permanecesse ainda hoje em discussão. Um dos motivos é que, embora possa ser rejeitado como um todo, ainda não foi possível refutá-lo com base exclusivamente na lógica. Embora a razão passe a ocupar um papel mais relevante nos desenvolvimentos deste período, ainda permanece subordinada a a fé. A importância da inteligência e do conhecimento se dá na medida em que devemos evitar a adesão a fé seja passiva ou injustificada. Portanto, a razão deverá moderar a inteligência humana para justificar e compreender a fé.

Referências bibliográficas:

DROBNER, Hubertus. Manual de Patrologia. Petrópolis: Vozes, 2003.
HIRSCHBERGER, Johannes. História da Filosofia na Idade Média. Trad. Alexandre Correia. São Paulo: Herder, 1966.
McGrath, Alister. 1998. Historical Theology: An Introduction to the History of Christian Thought. Oxford: Blackwell Publishers. Chapter 1 'The Patristic Period, c. 100-451.
SPINELLI, Miguel. Helenização e recriação de sentidos: a filosofia na época da expansão do cristianismo, séculos II, III, e IV. 2ª Edição Revisada e Ampliada. Caxias do Sul: EDUCS (Editora Universidade de Caxias do Sul), 2015.

Mestre em Filosofia (UFPR, 2013)
Bacharel em Filosofia (UFPR, 2010

FONTE: http://www.infoescola.com/filosofia/patristica/

FILOSOFIA PATRÍSTICA E ESCOLÁSTICA

FILOSOFIA PATRÍSTICA E ESCOLÁSTICA
A Patrística, Escola Patrística ou Filosofia Patrística, foi uma corrente filosófica cristã da época medieval que surgiu no século IV. Recebe esse nome pois ela foi desenvolvida por diversos padres e teólogos da Igreja, os quais eram chamados de “Pais da Igreja”. Sua figura mais importante foi Santo Agostinho de Hipona.

Características da Patrística

A Patrística é considerada a primeira fase da filosofia medieval. Sua principal característica era a expansão do Cristianismo na Europa e o combate aos hereges. Por isso, essa doutrina filosófica foi representada pelo pensamento dos Padres da Igreja, que aos poucos auxiliaram na construção da teologia cristã. Baseada na filosofia grega, os filósofos desse período tinham como objetivo central compreender a relação entre a fé divina e o racionalismo científico. Ou seja, eles buscavam a racionalização da fé cristã. Portanto, os principais temas explorados por eles estavam ancorados nas vertentes do maniqueísmo, ceticismo e neoplatonismo. São eles: criação do mundo; ressurreição e encarnação; corpo e alma; pecados; livre arbítrio; predestinação divina.

A Patrística e Santo Agostinho

Santo Agostinho (354-430) foi teólogo, bispo, filósofo e o principal expoente da Patrística. Seus estudos estiveram voltados para a luta do bem e do mal (maniqueísmo), bem como do neoplatonismo. Além disso, ele focou no desenvolvimento do conceito de “pecado original” e do “livre arbítrio” como forma de livrar do mal. A “predestinação divina”, associada à salvação dos homens pela graça divina, também foi um dos temas explorados por Agostinho. Acreditava na fusão da fé (representada pela Igreja) e da razão (representada pela Filosofia) para encontrar a verdade. Ou seja, as duas poderiam trabalhar juntas, cuja razão auxiliaria a busca da fé, que por sua vez, não poderia ser atingida sem o pensamento racional.

Patrística e Escolástica

A Patrística foi o primeiro período da filosofia medieval que permaneceu até o século VIII. Durante sete séculos, a filosofia esteve voltada para os ensinamentos dos “homens da Igreja” (teólogos, padres, bispos, etc.). Logo depois, surgiu a Escolástica no século IX. Esta permaneceu até o início do Renascimento, no século XVI. São Tomás de Aquino (1225-1274), chamado de “Príncipe da Escolástica”, é o maior representante dessa escola e seus estudos ficaram conhecidos como Tomismo. Ele foi nomeado Doutor da Igreja Católica, em 1567. Como a Patrística, a filosofia Escolástica também esteve inspirada na filosofia grega e na religião cristã. Seu método dialético de unir a fé e a razão tinha como intuito o crescimento humano. Importante destacar que seus estudos estiveram inspirados no realismo aristotélico, enquanto que os de Santo Agostinho estavam voltados para o idealismo de Platão. Sendo assim, a Patrística focou na disseminação dos dogmas associados ao Cristianismo, por exemplo, defendendo a religião cristã e refutando o paganismo. Já a Escolástica, através do racionalismo, tentou explicar a existência de Deus, do céu e do inferno, bem como as relações entre o homem, a razão e a fé.

FILOSOFIA DA RELIGIÃO

Filosofia da Religião

Filosofia da Religião é um ramo filosófico que investiga a esfera espiritual inerente ao homem, do ponto de vista da metafísica, da antropologia e da ética. Ela levanta questionamentos fundamentais, tais como: o que é a religião? Deus existe? Há vida depois da morte? Como se explica o mal? Estas e outras perguntas, idéias e postulados religiosos são estudados por esta disciplina.
Há uma infinidade de religiões, compostas de distintas modalidades de adoração, mitologias e experiências espirituais, mas geralmente os estudiosos se concentram na pesquisa das principais vertentes espirituais, como o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo, pois elas oferecem um sistema lógico e elaborado sobre o comportamento do planeta e de todo o Universo, enquanto as orientais normalmente se centram em uma determinada filosofia de vida. Os filósofos têm como objetivo descobrir se o olhar espiritual sobre o Cosmos é realmente verdadeiro.
Em suas pesquisas o filósofo da religião adota como instrumentos teóricos a metodologia histórico-crítica comparativa, que contrapõe as mais diversas religiões, espacial e temporalmente, para perceber suas semelhanças e o que as distingue, logrando assim visualizar o núcleo central dos eventos religiosos; a filológica, que realiza a investigação dos vários idiomas, comparando-os e buscando expressões usadas para se referir ao sagrado, estabelecendo assim o que elas têm em comum; e a antropológica, que resgata o passado espiritual dos povos ancestrais e dos contemporâneos, seus institutos, suas convicções, seus ritos e seus valores. Cabe à Filosofia da Religião realizar uma correta associação destes distintos métodos, para assim perceber claramente o que é essencial nas religiões.
Em todas as religiões vigentes no Ocidente há algo em comum, a fé em Deus. A Divindade é vista como um Ser sem corpo e eterno, criador de tudo que há, extremamente generoso e perfeito, todo-poderoso, ou seja, onipotente, conhecedor de tudo, portanto onisciente, presente em toda parte, melhor dizendo, onipresente. Esta é a imagem teísta de Deus, aquela que proclama sua existência. São Tomás de Aquino defende pelo menos cinco argumentos a favor da presença de Deus no Universo, entre eles o ontológico, o cosmológico e o do desígnio. Estas idéias foram renovadas pelos pensadores modernos Alvin Plantinga e Richard Swinburne, que tornaram estes conceitos mais complexos. A compreensão de Deus pode ser racional, portanto do âmbito da Teologia Natural, ou percebida do ponto de vista da fé, constituindo a Teologia Revelada.
Anteriormente ao século XX, a trajetória filosófica ocidental procurava explicar alguns ângulos das tradições pagãs, do judaísmo e do Cristianismo, ao passo que no Oriente, em práticas espirituais como o hinduísmo, o budismo e o taoísmo, não é fácil perceber até que ponto uma pesquisa é de natureza religiosa ou filosófica. Não é fácil para esta disciplina delimitar um objeto de estudo adequado, do ponto de vista religioso. Segundo estes filósofos, mesmo que se alcance uma caracterização correta de Deus, ainda resta encontrar uma razão para se pretender sua existência.
Embora na Idade Média tenham surgido muitas teorias que se pretendem capazes de provar que Deus existe, a partir do século XVIII houve uma guinada na mentalidade humana, e muitos dos argumentos defendidos na era medieval perderam sua validade. Assim, muitos filósofos religiosos têm suas próprias prevenções contra a cultura religiosa popular, como Kant e Feuerbach, o qual estimulou o estudo das religiões do ângulo social e antropológico destas convicções espirituais, caminho seguido até hoje por grande parte dos filósofos desta disciplina.
FONTE: http://www.infoescola.com/filosofia/filosofia-da-religiao/

FILOSOFIA E RELIGIÃO

FILOSOFIA E RELIGIÃO


A filosofia e a religião buscam a resolução do mesmo problema básico, a questão do Ser, do que existe, do homem e seu dilema moral. As explicações e os métodos aplicados são diferentes, mas as respostas que buscam são idênticas.
A filosofia que se baseia inteiramente na razão nasceu, quando as academias gregas se afastaram das crenças nos deuses mitológicos, considerando somente argumentos racionais, a busca pela solução dos problemas é somente através do pensamento lógico. A religião é o inverso da filosofia, se baseia na fé, acreditar em algo na qual não se pode comprovar, na crença inabalável de ensinamentos impostos por revelações divinas, o que leva à rotinas e dogmas.
Explicar a misteriosa origem do universo somente com o uso da razão, sem mostrar o inexplicável como vontade divina, iniciou um diálogo, muitas vezes um confronto entre fé e razão. 
A filosofia variou entre épocas que acreditava em uma divindade superior e em épocas que não acreditava, essas épocas refletem na busca do homem pelo conhecimento de si mesmo e do mundo onde vive. O surgimento da filosofia se deu na tentativa de superar uma fé cega em que os gregos viviam, tentando explicar os fenômenos através de causas racionais e não através dos mitos. Mais tarde, o cristianismo lutou para impor seu domínio ideológico, e logo depois o renascentismo batalhou contra a inquisição da Igreja. O Iluminismo é a maior expressão desse movimento, quando se esperava a superação total das crenças pela razão. Porém, alguns filósofos acreditam que o melhor meio de alcançar as divindades é através da razão. Só é possível conhecer o Autor do universo pela busca do conhecimento das coisas, assim a religião convidaria os homens ao conhecimento e essa busca seria através da filosofia. Pensadores como Tomás de Aquino e Agostinho acreditam que a filosofia complementa a religião. 


FONTE:https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/pedagogia/religiao-e-filosofia/49687

terça-feira, 4 de abril de 2017

FILOSOFIA: OPINIÃO E CONCEITO

OPINIÃO E CONCEITO

Sócrates, filósofo grego da Antiguidade, instituiu um método para a construção do saber, ou seja, o diálogo. O diálogo socrático realizava-se sob dois momentos distintos: a ironia e a maiêutica. Na ironia procurava confundir o interlocutor a respeito do que este julgava saber; na maiêutica instruía sobre o que ele poderia aprender. As perguntas que Sócrates fazia tinha por objetivo aprofundar o tema em questão. Dizia que nada sabia, e por isso perguntava a quem ele julgava que soubesse.
Para Sócrates as opiniões devem ser destruídas. De acordo com o pensamento deste filósofo, o indivíduo, movido pela sensação, vai adquirindo conhecimentos falsos e incorporando muitos vícios ao seu patrimônio intelectual. Acha ele que esses pseudoconhecimentos são adventícios, e, que uma reflexão mais cuidadosa sobre eles fará o indivíduo mudar de parecer, motivando-o na busca do conceito.
Após confundir o interlocutor sobre aquilo que ele julgava saber (opinião), Sócrates partia para a construção do conceito. O conceito era o resultado das perguntas que ele fazia com o objetivo de aprofundar o tema em questão. Penetrava no âmago do problema, sem contudo ter a pretensão de descobrir a verdade total. Pelo contrário, indo até às últimas consequências, deixava sempre um campo aberto para posteriores pesquisas.
O método socrático, como vemos, é o de perguntar. A avaliação pedagógica atual está muito mais interessada nas respostas do que nas perguntas dos alunos. Aliás, a maioria dos testes psicotécnicos medem a capacidade de responder; poucos, a de perguntar. Por isso, diz-se que as pessoas deveriam ser avaliadas pelas perguntas que fazem, e não somente pelas respostas que dão. É que as perguntas revelam o caráter espontâneo do indivíduo, enquanto a resposta aquilo que ele tira do livro.
A apreensão do conceito, sendo racional, deveria encaminhar o indivíduo para a prática da virtude, pois a razão não pode conceber a Verdade à parte do bem. Conceber as pessoas dentro da totalidade, imaginando-as como parte integrante de uma população cósmica e espiritual, é de suma importância para a ampliação de nossa visão com relação ao "eu", ao "outro" e ao "nós".

Renunciemos às nossas opiniões particulares. Posteriormente, procuremos descobrir o conceito que se oculta por trás das coisas sensíveis. Esta é a regra áurea para bem conduzir o nosso pensamento na busca da verdade.

SENSO COMUM E A FILOSOFIA

SENSO COMUM

O senso comum possui uma importância enorme na história dos problemas filosóficos, s Na história da filosofia, o problema do senso comum sempre foi um ponto de enorme importância e grandes debates. Os filósofos clássicos, como Sócrates, Platão e Aristóteles, dedicaram-se a refletir sobre isso e situar esse tema dentro dos problemas que interessam à reflexão filosófica.
Grosso modo, o sentido mais profundo da expressão “senso comum” remete ao tipo de experiência que é propriamente humana, isto é, a experiência do sofrimento ou a experiência tradicional. Um dos elementos que tornam o homem diferente das outras criaturas é a sua capacidade de refletir sobre o sofrimento, de saber que vai morrer, que pode ser acometido por catástrofes, doenças, etc. A experiencia tradicional nos dá os elementos para a compreensão de nossa condição de seres falíveis. As tragédias antigas (tão valorizadas por Aristóteles) davam conta dessa experiência. A literatura moderna e contemporânea também o faz.
Sendo assim, o senso comum é o tipo de saber que busca fornecer orientação ao homem e não deixá-lo repetir os erros do passado. Por intermédio da experiência, o homem pode exercer virtudes, como a prudência e a paciência, e aprender a não se deixar levar por aventuras emocionais, que o desviam para a irracionalidade, bem como não se deixar levar por “sonhos racionais” de progresso a qualquer custo. Como disse o pintor espanhol Goya, “O sonho da razão produz monstros”.
O conceito de senso comum sofreu certa desvalorização após o período do Renascimento. O humanismo renascentista foi a última corrente de reflexão que levava em conta o potencial orientador do senso comum. A partir do século XVII, sobretudo com o desenvolvimento da ciência moderna e da filosofia racionalista cartesiana, o senso comum passou, de forma geral, a ser identificado como “falta de rigor metodológico” e a ser rivalizado com o “senso crítico” ou “senso científico”. Dessa forma, até o início do século XX, eram poucas as defesas filosóficas que se faziam do senso comum, haja vista que a expressão havia sido alijada de seu sentido tradicional.

Os filósofos ligados à fenomenologia e à hermenêutica do século XX, como Heidegger e Gadamer, passaram a refletir novamente sobre o senso comum, colocando-o diante do problema da historicidade, isto é, da experiência histórica humana. Autores de outras tradições, como o católico leigo G. K. Chesterton, também passaram a fazer, ao seu modo, a defesa do senso comum, sobretudo recuperando o seu sentido tradicional.obretudo por estar associado à experiência tradicional.

FILOSOFIA GREGA - PERÍODOS

FILOSOFIA GREGA

A Filosofia tem lugar de nascimento, a Grécia, e um “pai”, Tales de Mileto. A Filosofia grega surgiu a partir da poesia, da religião e das condições sociopolíticas.
A Filosofia, como conhecemos hoje, ou seja, no sentido de um conhecimento racional e sistemático, foi uma atividade que, segundo se defende na história da filosofia, iniciou na Grécia Antiga formada por um conjunto de cidades-Estado (pólis) independentes. Isso significa que a sociedade grega reunia características favoráveis a essa forma de expressão pautada por uma investigação racional. Essas características eram: poesia, religião e condições sociopolíticas.

COSTUMA-SE DIVIDIR A FILOSOFIA GREGA EM QUATRO PERÍODOS:

a) PERÍODO PRÉ-SOCRÁTICO – do século VII ao século V a.C. Caracterizado pela investigação acerca da physis e pelo início de uma forma de argumentar e expor as ideias;
b) PERÍODO SOCRÁTICO – do final do século V ao século IV a.C. Caracterizado pela investigação centrada no homem, sua atividade política, suas técnicas, sua ética. Também considerado o apogeu da filosofia grega;
c) PERÍODO PÓS-SOCRÁTICO – do século IV ao século III a.C. Caracterizado pela tentativa de apresentar um pensamento unificado a partir de diversas teorias do passado. Interessava em fazer a distinção entre aquilo que poderia ser objeto do pensamento filosófico.
d) PERÍODO HELENÍSTICO OU GRECO-ROMANO – do século III a.C. ao século VI d.C. Engloba o período do Império Romano e dos Padres da Igreja. Trata-se das relações entre o homem, a natureza e Deus.

POESIA GREGA

Os poetas gregos, como Homero, desempenhavam papel bastante importante na educação dos jovens gregos. Os poemas homéricos continham características que serviriam de base para o desenvolvimento da filosofia. A principal delas é a busca pelas causas dos acontecimentos narrados, procurando uma narrativa que contemplasse a realidade da forma mais completa possível.
Outro poeta grego, Hesíodo, tem grande importância para o pensamento grego por ter narrado o nascimento dos deuses, uma forma de tentar explicar a origem do universo, tema que apareceria no primeiro filósofo, Tales de Mileto. A Teogonia de Hesíodo faz coincidir os deuses com fenômenos da natureza e partes do universo, que teria sido originado a partir de Caos, o primeiro deus a se gerar.
Além disso, temos dois temas que aparecem nos poetas que marcarão o início da filosofia grega: a noção de justiça como valor supremo e o conceito de limite, que Aristóteles desenvolveria como a noção de “justa medida”.

RELIGIÃO

Havia duas expressões da religião grega: a religião pública, aquela que conhecemos pelos poemas de Homero e a religião dos mistérios, praticada em círculos restritos por aqueles que não consideravam suficiente a religião pública.
Dentre os “mistérios”, aquele que mais importa para o nascimento da filosofia grega é o Orfismo, nome derivado de seu fundador, o poeta trácio Orfeu. O Orfismo inaugura uma concepção da existência humana distante do naturalismo: enquanto a religião pública considerava o homem mortal, o Orfismo opõe corpo e alma, sendo que o corpo seria mortal, mas não a alma. Do Orfismo são tributárias as filosofias de Pitágoras, Heráclito, Empédocles e Platão.
Outro aspecto importante da religião grega era a inexistência de um livro sagrado. As crenças eram difundidas pelos poetas, mas com uma visão não dogmática e sem uma autoridade que teria o direito de proteger os dogmas. Com isso, os filósofos gregos não enfrentaram resistência religiosa à sua liberdade de pensamento.

CONDIÇÕES SOCIOPOLÍTICAS

Antes de existirem as polis, a sociedade grega se agrupava em comunidades compostas por pessoas com um antepassado em comum, comunidades chamadas de genos. O poder de decisão era concentrado na figura do mais velho do grupo, o pater. Com o aumento do número de pessoas em relação à quantidade de terras produtivas, iniciaram-se conflitos e, depois de um extenso desenrolar histórico, surgiu a noção de propriedade privada: para resolverem os conflitos no interior dos genos, decidiu-se dividir as terras. Essa decisão, no entanto, foi baseada no critério mais forte para eles, o grau de parentesco. Assim, a proximidade sanguínea com o patriarca determinou tanto aqueles que se tornaram grandes proprietários, tanto aqueles que ficaram sem terras e se tornaram escravos ou artesãos.
Formaram-se assim as fratrias, pelo reagrupamento dos genos, e a organização das fratrias, deu origem às tribos. As tribos eram independentes e, por isso, podiam combater entre si. Entre as tribos que conhecemos, destacaram-se os aqueus, os eólios, os dórios e os jônios. Então, a Grécia Antiga não era formada por um Estado único e quando falamos “os gregos”, não falamos sobre um único povo. Aos poucos, cada tribo fundou uma cidade-Estado, ou seja, uma polis, no ponto mais alto da região onde se situavam.
Muitos aqueus se instalaram em ilhas e em costas da Ásia Menor; os jônicos fundaram cidades como Mileto e Éfeso. Por conta das condições geográficas, eles desenvolveram atividades econômicas voltadas para a navegação, comércio e artesanato. A adoção do regime monetário fortaleceu aqueles que viviam dessas atividades e se afastaram da organização social micênica que tinha seu fundamento na aristocracia de sangue.
A partir do século VII a.C., os homens e as mulheres não se satisfazem mais com uma explicação mítica da realidade. O processo de transformação e de criação envolvido no desenvolvimento de técnicas leva ao questionamento a respeito do universo, se ele também não respondia a um processo semelhante.
É em Mileto, situado na Jônia (atual Turquia), litoral ocidental da Ásia Menor que as perguntas a respeito da natureza exterior do mundo se desvincularam da mitologia. Os dados da experiência sensível (frio, quente, pesado, leve, por exemplo) passaram a ser explicados de uma forma racional. Eram entendidos também como realidades em si – por isso se falava em “O quente”, “o frio”, “o pesado”, “o leve”.
Por meio desse exercício do pensamento, os filósofos pretendiam analisá-los em relação ao todo, pois a razão parecia exigir uma unidade no lugar da multiplicidade que até então não havia sido problematizada.
Os principais pensadores da escola de Mileto (ou também “escola jônica” ou “milesiana”) são Tales, considerado o pai da filosofia, Anaximandro e Anaxímenes. Os pensadores dessa escola se caracterizam pela preocupação com a physis, palavra grega que pode ter o sentido de “natureza ou fonte originária”, mas também de “processo de surgimento e de desenvolvimento”.

Importante notar que nessa época não havia uma clara distinção entre as áreas do saber como temos hoje – ciência, religião, filosofia e matemática, por exemplo. Por esse motivo, muitos dos filósofos pré-socráticos podiam ser também líderes religiosos, cientistas, médicos ou matemáticos.